Parece que o amor chegou aqui

Com qualquer dúvida que se possa ter
é inevitável amar alguém.
O amor chega. Sempre chega.

O amor cega.

Quando o amor chegou pela primeira vez
vestia um vestido verde e tinha longos cabelos loiros
cabelos cacheados.

O amor sabia de cor o hino colorado.

Mas eu me assustei quando ele chegou
pois eu jamais havia visto o amor de tão perto
então eu fugi de medo.

O amor foi embora cedo.

Quando o amor chegou pela segunda vez
tinha aparelhos nos dentes e olhos verdes-escuros
e pele macia e andava comigo de mãos dadas na chuva.

O amor caiu como uma luva.

Mas o amor não prometeu ficar quando ele chegou
e me deixou em três dias e sete horas
e sem ao menos falar a verdade.

O amor era amizade.

Quando o amor chegou pela terceira vez
vinha com minha banda favorita tatuada no peito
e com uma voz que acalmasse a dor.

O amor curou o anterior.

Mas o amor um dia adoeceu e cansou de ser cura
se mudou para outro continente para ser curado
e tudo que deixou foi a saudade.

O amor não era de verdade.

Quando o amor chegou pela quarta vez
tinha olhos verdes e cabelos loiros lisos e usava aparelho
e amava aos animais mais do que tudo.

O amor me deixou mudo.

Mas o amor um dia foi sufocado por eu ser o primeiro amor
e o amor também mentiu e trapaceou e traiu
e foi embora machucado.

O amor foi só inventado.

 

Quando o amor chega e vai embora
tantas e tantas vezes é de se pensar
que talvez o amor não fosse lá essas coisas.

Quando o amor veio pela primeira vez
e mentiu pela segunda vez
e sumiu pela terceira vez
e mentiu mais uma vez
era justo que não voltasse mais.

Era justo não olhar para trás.

 

Mas o amor aguarda.

O amor agrada e espera.

O amor talvez vista a camiseta do arquirrival
e saia pelas ruas comemorando sua derrota.
Talvez o amor me encontre quando tocar a campainha
ou quando bater na porta errada
e essa porta virar a certa.

O amor tem alma esperta.

Talvez o amor chegue em um filme do Tarantino
ou em uma canção do Bob Dylan
ou em um personagem de Bukowski, Dostoievski
ou Hemingway.

Talvez o amor leia a Capricho.

Talvez o amor não leia a Rolling Stone.

Talvez o amor chegue como uma velha amizade
ou talvez o amor derrube sorvete de baunilha em ti
sem querer e pede desculpas por ser tão desastrado.

O amor foi encontrado.

E o amor manda mensagem perguntando
“qual ônibus eu pego para chegar aí?”
e o amor liga para dizer que deu tudo certo no teste de hoje
e o amor aprende a ler a Rolling Stone contigo
e você já sabe de cor as matérias da Capricho desse mês.

O amor pergunta se não quer pegar um cinema na sexta-feira
quando ainda é segunda e vocês vão na terça
e vão na quarta de novo.

O amor está na livraria e manda foto de um livro
dizendo que você vai amar
e quando você chega em casa este livro está na sua mesa.

O amor talvez tenha uma pinta na mão
e usa a palavra “droga” diversas vezes ao dia.

E o amor te liga antes de dormir
para dizer que precisava ligar para você
antes de dormir.

Parece que o amor chegou aqui.

E o amor chegou um pouco atrasado
e mostrou que você estava enganado
quando pensou que o amor havia passado
e mentido e sumido e que você estava enganado.

Não era amor, era qualquer outra coisa
e o amor mostrou para você
que você pensou errado
pois o amor recém havia chegado.

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